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Inconstitucionalidade da negativa de registro de aposentadoria pelos tribunais de contas



DA INCONSTITUCIONALIDADE DA NEGATIVA DE REGISTRO DE APOSENTADORIA PELOS TRIBUNAIS DE CONTAS EM CASO DE MUDANÇA DE REGIME DO SERVIDOR PÚBLICO NO QUINQUÊNIO ANTERIOR À APOSENTADORIA.



Infelizmente tem sido corriqueira a negativa de registro de aposentadoria por parte do TCU pela “não observância da regra de cinco anos de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria” nas hipótese em que o servidor ascende na carreira sem alteração de cargo.


Trata-se de excesso desarrazoado.


É que o referido entendimento altera por completo o significado do texto constitucional quando exige “cinco anos de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria”, para ressignificá-lo como “cinco anos de contribuição sob uma determinada carga horária e consequente remuneração”.


Com efeito, o artigo 6º da Emenda Constitucional n.º 41/2003, combinado com o § 5º do artigo 40 da Constituição Federal ostenta a seguinte redação:


Art. 6º Ressalvado o direito de opção à aposentadoria pelas normas estabelecidas pelo art. 40 da Constituição Federal ou pelas regras estabelecidas pelo art. 2º desta Emenda, o servidor da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, que tenha ingressado no serviço público até a data de publicação desta Emenda poderá aposentar-se com proventos integrais, que corresponderão à totalidade da remuneração do servidor no cargo efetivo em que se der a aposentadoria, na forma da lei, quando, observadas as reduções de idade e tempo de contribuição contidas no § 5º do art. 40 da Constituição Federal, vier a preencher, cumulativamente, as seguintes condições:


I - sessenta anos de idade, se homem, e cinquenta e cinco anos de idade, se mulher;

II - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;

III - vinte anos de efetivo exercício no serviço público; e

IV - dez anos de carreira e cinco anos de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria.

§ 5º do artigo 40 da Constituição Federal:

§ 5º Os requisitos de idade e de tempo de contribuição serão reduzidos em cinco anos, em relação ao disposto no § 1º, III, "a", para o professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98).


Temos que a regra constitucional estabelece como requisitos para aposentação o cumprimento de requisitos de i) idade, ii) de tempo de contribuição, iii) de tempo de efetivo exercício no serviço público, iv) de tempo na carreira e de v) tempo de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria.


Em relação ao ponto tratado no presente artigo, qual seja, o real significado do termo cargo para fins de aferição do cumprimento relativo ao requisito tempo de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria, a lei esclarece a questão.


Com efeito, dispõe o art. 3º da Lei 8.112/90 que:


“Cargo público é o conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na estrutura organizacional que devem ser cometidas a um servidor”.


Portanto, com a devida vênia, não se sustenta eventual interpretação que ignora a expressão exercício do cargo confundindo-a com contribuição sob uma determinada carga horária e consequente remuneração. Aqui vale a máxima “verba cum effectu, sunt accipienda”. Não se pode ignorar que, ao tratar do cargo o texto constitucional, fala em “efetivo exercício” e não em “efetiva contribuição”.


Por isso, é contrário ao texto constitucional exigir “cinco anos de contribuição sob cada patamar de remuneração”, porque a exigência da contribuição já consta de dispositivo próprio.


Aqui cabe trazer a lume excerto de parecer acerca da mate´ria da lavra dos abalizados Drs. Rodrigo Valgas dos Santos e Alexander Santana:


“O acórdão do TCU fala em preservação do equilíbrio financeiro e atuarial e do caráter contributivo do regime de previdência. Contudo, essas preocupações e ponderações concretas já foram objeto da atenção do legislador constituinte que, avaliando todo o sistema, entendeu que as regras fixadas atendiam a tais critérios.

Por isso, os citados princípios são concretizados justamente pela obediência aos requisitos estabelecidos pelo legislador, descabendo interpretar e aplicar a norma de modo dissociado do texto do artigo 6º da Emenda Constitucional nº 41/2003, combinado com o § 5º do artigo 40 da Constituição Federal.”


Sabe-se que a restrição ou limitação a direitos fundamentais deve ser expressa no texto constitucional, não podendo-se alargar a norma para além dos limites fixados pelo constituinte derivado.


Há decisões vinculantes do STF acerca da temática no mesmo sentido aqui sustentado.


Tratam-se dos Temas 578 e 1207, cujos Leading Cases foram os Recursos Extraordinários n.ºs 662423 e 1322195, julgados sob a égide da repercussão geral.


Em relação ao tema 578, a hipótese versava sobre negativa do Tribunal de Contas Estadual ao registro da aposentadoria de Procurador de Justiça que havia sido promovido há menos de cinco anos, eis que alegadamente ausente o requisito do lapso temporal necessário no cargo.


Quando do julgamento, o STF decidiu que “nas carreiras escalonadas, a unidade é representada não por cada um dos cargos que a compõem – os quais são frações, estágios, degraus – mas, sim, pela carreira vista como um todo”. A decisão foi cristalizada por meio do Tema 578:


Tema 578, Leading Case RE 662423, Relator MIN. DIAS TOFFOLI:


Ressalvado o direito de opção, a regra de transição do art. 8º, inciso II da Emenda Constitucional n.º 20/98, somente se aplica aos servidores que, quando da sua publicação, ainda não reuniam os requisitos necessários para a aposentadoria; (ii) em se tratando de carreira pública escalonada em classes, a exigência instituída pelo art. 8º, inciso II da Emenda Constitucional n.º 20/98, de cinco anos de efetivo exercício no cargo no qual se dará a aposentadoria, deverá ser compreendida como cinco anos de efetivo exercício na carreira a que pertencente o servidor.


Em síntese, o STF reafirmou sua jurisprudência de que a promoção dentro da mesma carreira não interrompe a contagem do prazo do efetivo exercício no cargo, mas que este deve ser contado desde o início do ingresso originário na carreira. Esclareceu a Corte que, se em virtude de promoção, o servidor passa a exercer novas funções, é certo que o vínculo outrora existente não se rompe, remanesce o mesmo. Constou ainda do voto do relator Ministro dias Toffoli:


“Ademais, mostra-se absolutamente irrazoável que após anos e anos de contribuição na mesma carreira, o indivíduo tenha sua aposentação obstada por uma exigência de cinco anos de permanência no nível funcional em que se encontrava no momento do requerimento administrativo” e que “Não há nenhuma justiça ou razoabilidade em condicionar a aposentadoria ao exercício efetivo do cargo de procurador de justiça por um período de cinco anos”.


O relator ainda alertou para “a penalização indevida do servidor ou membro que, tendo cumprido todas as condicionantes insculpidas em lei, logrou, por meio de promoção, galgar degrau superior de sua carreira. Dito de outra forma, pune-se o bom servidor e desestimula-se o mecanismo da promoção, numa lógica inversa àquela que orienta a organização dos cargos em carreira”.


O STF reiterou sua posição em decisão recentíssima, de março de 2022, cujo Leading Case foi o Recurso Extraordinário n.º 1322195, reafirmando a jurisprudência do Pretório Excelso no sentido de que a promoção do servidor não interrompe o prazo de contagem do tempo no cargo:


Tema 1207, Leading Case RE 1322195, Relator MINISTRO LUIZ FUX:


A promoção por acesso de servidor a classe distinta na carreira não representa ascensão a cargo diverso daquele em que já estava efetivado, de modo que, para fins de aposentadoria, o prazo mínimo de cinco anos no cargo efetivo, exigido pelo artigo 40, § 1º, inciso III, da Constituição Federal, na redação da Emenda Constitucional 20/1998, e pelos artigos 6º da Emenda Constitucional 41/2003 e 3º da Emenda Constitucional 47/2005, não recomeça a contar pela alteração de classe.


Assim, ao lavrar o acórdão atacado, o TCU, data venia, extrapolou sua função constitucional ao atribuir natureza diversa a fato jurídico que já é qualificado pela Lei.


Em suma, não cabe ao TCU agir como legislador e alterar, sem base legal, a natureza jurídica do termo “cargo público” que já é qualificado como tal pela Lei 8112/1990, sendo eventual recusa de registro de aposentadoria em casos tais passiveis de anulação judicial.


Maceió, 05 de agosto de 2022



TIAGO RODRIGUES LEÃO DE CARVALHO GAMA

OAB/AL 7539






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