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O direito trabalhista e a “uberização” do trabalho economia de compartilhamento

Atualizado: 31 de jan. de 2022

O termo uberização é derivado do nome da empresa Uber Technologies Inc. fundada em 2009, que se popularizou a partir da relação informal de trabalho, no qual conecta os fornecedores de serviços aos clientes. Essa modalidade também é conhecida como economia de compartilhamento que viabiliza o acesso à bens e serviços por meio de tecnologias e plataformas digitais.

O termo uberização é utilizado também para toda atividade laboral que tem como base as plataformas tecnológicas e que englobam motoristas, entregadores e prestadores de serviços. Esse termo tem se familiarizado cada vez mais no mundo contemporâneo devido a grande procura desse trabalho informal em detrimento dos empregos formais, uma vez que o número de desempregados gira em torno de 13 milhões de pessoas no Brasil.

Em virtude do alto índice de desemprego as pessoas buscam alternativas de trabalho para o seu sustento, a procura pelo trabalho através dos aplicativos também virou alvo das pessoas que precisam fazer renda extra para complementar a renda da família.

Vale esclarecer que o cenário atual em relação a grande procura pela uberização não é opcional, diante da falta de um emprego formal e da necessidade de sobrevivência as pessoas se submetem aos trabalhos informais para sobreviverem.

Não podemos deixar de ressaltar que a uberização teve um crescimento bem considerável em decorrência da pandemia mundial do COVID-19 que iniciou em meados de março de 2020 gerando reflexo até os dias atuais.

Antes de adentrarmos nas questões jurídicas quanto a uberização, vale a pena transcrever os artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis Trabalhistas - CLT, nos quais norteiam os requisitos para o reconhecimento de vínculo empregatício. Vejamos:

Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.
Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Segundo a CLT, empregado é "toda pessoa física que presta serviços de natureza não eventual a empregador, sob dependência deste e mediante salário" (art. 3º da CLT).

Deve se ter em mente que a flexibilização dos elementos tradicionais trazidos no artigo 3º da CLT, situando as normas no contexto temporal em que serão aplicadas a partir dos avanços da tecnologia em relação ao novo padrão de organização do trabalho devem ser analisadas e ponderadas.

Extrai-se desta definição que são elementos fático-jurídicos para o reconhecimento da relação de emprego: ser pessoa física; a pessoalidade; a não eventualidade, a onerosidade e, por fim, a subordinação.

Baseando-se nessa premissa, alguns julgadores entende que os trabalhadores da modalidade uberização se enquadram no que fala o artigo 3º da CLT.

A uberização se enquadra no modelo mais informal e flexível de trabalho, porém esse cenário está tomando outro rumo. Apesar de ser configurado como trabalho informal, as empresas que se utilizam principalmente dos serviços dos motociclistas, no qual se englobam nesse cenário da uberização, tem sentido uma alta nas demandas trabalhistas, no qual os trabalhadores acionam a Justiça do trabalho a fim do reconhecimento de uma relação empregatícia.

Alguns tribunais têm decidido o reconhecimento vínculo baseando-se nas novas modalidades de vínculos empregatícios que vem surgindo com o passar dos anos, visto que os referidos artigos alhures foram editados na década de 40, porém também existem entendimentos contrários. Vejamos alguns desses entendimentos:


PROCESSO nº 0010165-98.2021.5.03.0184 (RORSum), RECORRENTE: WLADIMIR VILLAFORT VIEIRA, RECORRIDO: LOGGI TECNOLOGIA LTDA. RELATOR (A): DES. MARIA CECÍLIA ALVES PINTO. Acórdão

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em Sessão Ordinária Telepresencial da Primeira Turma, hoje realizada, julgou o presente processo e, à unanimidade, rejeitou preliminar arguida em contrarrazões e conheceu do recurso ordinário interposto pelo autor (Id 90571bb), porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade; no mérito, sem divergência, negou provimento ao apelo, mantendo a r. sentença (Id 68b99a3), proferida pela MM. Juíza Jane Dias do Amaral, ainda que diversos fundamentos. RAZÕES DE DECIDIR/FUNDAMENTOS ACRESCIDOS: PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO ARGUIDA EM CONTRARRAZÕES. Sustenta a reclamada que o apelo não deve ser conhecido por aplicação da Súmula 422, III do TST, pois a leitura do recurso demonstra que não houve impugnação aos fundamentos da sentença. Nos termos do art. 1010, II e III/CPC/2015, bem como da nova redação da Súmula 422/TST, deixa-se de conhecer do apelo, por ofensa ao princípio da dialeticidade (ou discursividade), apenas quando a motivação do recurso for inteiramente dissociada dos fundamentos da sentença, o que não é o caso dos autos. De uma simples análise, verifica-se que o apelo apresentado traz os fundamentos de fato e de direito exigidos por lei, contemplando os requisitos exigidos para o conhecimento de seu apelo. Ressalte-se, ainda, que o art. 899/CLT preceitua que os recursos poderão ser interpostos por simples petição. Assim, como o recurso aponta, de forma clara, as razões de insurgência, não há desrespeito ao princípio da dialeticidade, ou tampouco se vislumbra a falta de interesse de agir. Dessa forma, o apelo traz os fundamentos nos moldes exigidos por lei. Rejeita-se a preliminar arguida. VÍNCULO DE EMPREGO: No caso em tela, é importante verificar a organização empresarial e como o motorista de aplicativo nela se encaixa, para que se faça uma análise dos elementos da relação de emprego à luz da teoria dos indícios qualificadores e, ainda, para permitir uma necessária releiturada dependência econômica - termo utilizado no art. 3º/CLT, que se coadune com a etapa atual do capitalismo. Entende esta Relatora que sobre os requisitos da relação de emprego (pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação, conforme análise combinada dos artigos 2º e 3º da CLT), a investigação quanto à presença da pessoalidade não oferece dificuldade, pois no processo de cadastramento do motorista, a ré identifica o profissional e a cada chamada realizada por um passageiro, a identificação do motorista (seja por nome, foto, ou ambas) é apresentada ao usuário, evidenciando a pessoalidade na prestação dos serviços. No aspecto, comprovados os requisitos dos artigos 2º e 3º da CLT, resta evidente a relação de emprego entre as partes, não obstante a tentativa da empresa em mascarar os traços característicos da relação subordinada de trabalho, no que se convencionou chamar de "uberização da relações de emprego". Entretanto, no caso específico dos autos, a reclamada apresentou defesa (Id fcbe5f3 - Pág. 2), afirmando que o autor utilizou a plataforma por apenas 4 dias, quais sejam, 25, 26, 28 e 29/04/2019, nos termos do extrato de Id 281d2ebo, documento este que não foi impugnado de forma específica, como se vê da manifestação de Id 4c2ee84. Nesse contexto, caracterizado que o autor utilizou da plataforma por apenas 4 dias, tem que não foram preenchidos os requisitos para a caracterização da relação de emprego, nos termos artigos 2º e 3º da CLT. Assim, deve ser mantida a decisão de origem, que julgou improcedente o pedido inicial, ainda que por fundamentos diversos.

(…). Belo Horizonte, 12 de julho de 2021. Assinatura DES. MARIA CECÍLIA ALVES PINTO. Relatora MBAR/F (TRT-3 - ROPS: 00101659820215030184 MG 0010165-98.2021.5.03.0184, Relator: Maria Cecilia Alves Pinto, Data de Julgamento: 15/07/2021, Primeira Turma, Data de Publicação: 30/07/2021.)



VÍNCULO EMPREGATÍCIO. REQUISITOS INDISPENSÁVEIS PARA CARACTERIZAÇÃO. Para a caracterização de vínculo empregatício faz-se necessária a presença concomitante dos requisitos: pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação jurídica. Admitida a prestação de serviços, incumbe à reclamada o encargo probatório quanto à ausência de algum dos requisitos mencionados acima. Não se desincumbindo a ré deste ônus, impõe-se reconhecer o vínculo empregatício entre as partes, nos moldes do art. 3º da CLT. (TRT-3 - RO: 00106399220195030005 MG 0010639-92.2019.5.03.0005, Relator: Angela C.Rogedo Ribeiro, Data de Julgamento: 06/10/2020, Primeira Turma, Data de Publicação: 07/10/2020.)


Não podemos deixar de mencionar que a uberização é positiva para o trabalho e também para a economia do país, tendo se tornado uma grande geradora de renda para a população.

Outrossim, uma das grandes preocupações da Justiça do Trabalho é a precarização do trabalho, ou seja, a perda de alguns direitos e garantias que o trabalho formal oferece. Com a prática do trabalho informal, os trabalhadores perdem garantias como direito a férias mais um terço constitucional, fundo de garantia, recebimento de horas extras, 13º salário, contribuição do INSS, entre outros.

Alguns entendimentos vem se baseando na premissa da evolução contemporânea, uma vez que, apesar de que todo e qualquer diploma legal deve ser lido e levado em consideração, sempre que necessário, deve-se levar em consideração também as novas modalidades de vínculos empregatícios que vem se desenvolvendo em cenários culturais, sociais e econômicos que surgem e se modificam com o passar dos tempos principalmente em decorrência dos avanços tecnológicos.

No presente artigo, percebe-se que apesar da informalidade com que é tratada a uberização, as empresas envolvidas nesse ramo vêm percebendo que o formato da informalidade não deve perdurar por muito tempo, uma vez que, sendo reconhecido cada vez mais o vínculo empregatício entre as partes, é possível daqui a há algum tempo essa modalidade se transformar em empregos formais, afastando desta forma a precarização do trabalho.


Wedja Santana Almeida da Silva - OAB/AL 13.279.


 

Referências Bibliográficas:



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