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Preterição em face da contratação de temporários

Atualizado: 12 de mai. de 2022

Este texto trata do direito à nomeação de aprovados em concursos públicos em face da contratação de temporários.



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Introdução


Ao longo dos anos, mesmo após a introdução da Constituição Federal de 1988, a qual prevê, em seu artigo 37, que a investidura de qualquer cidadão em cargo público deverá ser por meio de concurso público, muitos entes públicos continuam praticando a contratação de funcionários de forma irregular, burlando a legislação constitucional. Assim, rotineiramente, muitos municípios e estados, apesar de realizarem concurso público para suprir a carência nos mais diversos cargos em sua estrutura funcional, estando este em plena validade, procedem a contratação de profissionais de forma precária, indo de encontro não só a dispositivos constitucionais, como também à ordem classificatória dos concursos realizados, na medida em que preterem os candidatos aprovados. O presente trabalho visa à análise desta situação vivenciada em muitos municípios e estados brasileiros, demonstrando a ilegalidade praticada por tais entes, como também as soluções existentes para dirimir tais demandas.


Do Concurso Público


Com o advento da Constituição Federal, encerrou-se, pelo menos no mundo teórico, o velho costume existente no Brasil quanto à contratação irregular de pessoas pelos entes públicos, posto que o artigo 37 da Carta Superior é claro ao determinar que a investidura em cargo público dá-se através de concurso público de provas e títulos. Sobre o tema, é interessante transcrever o conceito de tal instituto jurídico por renomados juristas pátrios, como o doutrinador José dos Santos Carvalho Filho (em CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, 7a ed. Revista, ampliada e atualizada. Rio de Janeiro: Lumen Iuris, 2001, fls. 472), a saber: “Concurso Público é o procedimento administrativo que tem por fim aferir as aptidões pessoais e selecionar os melhores candidatos ao provimento de cargos e funções públicas. Na aferição pessoal, o Estado verifica a capacidade intelectual, física e psíquica de interessados em ocupar funções públicas e no aspecto seletivo são escolhidos aqueles que ultrapassam as barreiras opostas no procedimento, obedecidas sempre à ordem de classificação. Cuida-se, na verdade, do mais idôneo meio de recrutamento de servidores públicos”. O intuito maior do legislador constitucional foi garantir a impessoalidade para o ingresso aos quadros dos entes públicos, evitando-se, desta forma, apadrinhamentos e privilégios direcionados a pessoas específicas. Desta forma, é incontroversa que esta deve ser a única maneira de investidura em cargos públicos, devendo ser vedada condutas arbitrárias e ilegais praticadas pelos gestores públicos.

Da Preterição


Da existência de direito subjetivo dos candidatos à nomeação em face da preterição

A nossa Constituição Federal prevê, como regra, que a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, efetivando-se em um processo administrativo, objetivando realizar os princípios nela consagrados. O art. 37 assim dispõe a respeito:


“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:


I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei;


II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;


III - o prazo de validade do concurso público será de até dois anos, prorrogável uma vez, por igual período;


IV - durante o prazo improrrogável previsto no edital de convocação, aquele aprovado em concurso público de provas ou de provas e títulos será convocado com prioridade sobre novos concursados para assumir cargo ou emprego, na carreira;" (Grifo Nosso) Em tema de concurso público, é cediço que os concursandos não possuem direito subjetivo à nomeação, mas apenas expectativa. Contudo, essa expectativa se convola em direito subjetivo se houver preterição na ordem classificatória ou contratação a título precário, pela Administração, para o preenchimento de vagas existentes, em detrimento da nomeação de candidatos aprovados em certame ainda válido.


O STF já consolidou em súmula tal entendimento:


“Súmula 15: DENTRO DO PRAZO DE VALIDADE DO CONCURSO, O CANDIDATO APROVADO TEM O DIREITO À NOMEAÇÃO, QUANDO O CARGO FOR PREENCHIDO SEM OBSERVÂNCIA DA CLASSIFICAÇÃO”.


Esta é a situação que mais acontece pelo Brasil a fora, pois mesmo havendo candidatos aprovados em concurso público, tais entes contratam pessoas, em carácter precário para exercer os cargos disponíveis nos concursos públicos.


Vale salientar que, muitas vezes, os próprios candidatos são contratados pelo ente público para desempenharem, em caráter precário, as funções dos cargos aos quais concorreram e foram aprovados no concurso público, em indiscutível demonstração da necessidade de preenchimento de cargos vagos, restando clara a preterição.


O STJ tem entendido que a celebração de contratos precários pela Administração Pública, na vigência de concurso público anterior, confere aos candidatos preteridos direito líquido e certo à nomeação ao cargo pleiteado. É o que se extrai dos seguintes precedentes:


"RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO PARA O PROVIMENTO DE CARGO DE TÉCNICO JUDICIÁRIO. DIREITO À NOMEAÇÃO.


INEXISTÊNCIA. CANDIDATAS APROVADAS FORA DAS VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. AUSÊNCIA DE PRETERIÇÃO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO RECONHECIDO. RECURSO DESPROVIDO.


(...)


4. A jurisprudência mais abalizada já assentou a orientação de que referidos direitos estão condicionados ao poder discricionário da Administração quanto à conveniência e oportunidade do chamamento dos aprovados, salvo se ficar comprovado nos autos que houve a contratação de pessoal, de forma precária, dentro da validade do concurso, para o preenchimento de vagas existentes, hipótese que não se coaduna com a presente.


5. Recurso Ordinário desprovido, em consonância com o parecer ministerial." (RMS 24.721/ES, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5ª Turma, DJe de 29/09/2008).


"RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA O CARGO DE PROFESSOR. CONTRATAÇÕES, A TÍTULO PRECÁRIO, DURANTE A VALIDADE DO CERTAME. CONVOLAÇÃO DA EXPECTATIVA DE DIREITO À NOMEAÇÃO E POSSE EM DIREITO LÍQUIDO E CERTO.


1. Em tema de concurso público, é cediço que os concursandos não possuem direito subjetivo à nomeação, mas apenas expectativa. Contudo, essa expectativa se convola em direito subjetivo se houver preterição na ordem classificatória ou contratação a título precário pela Administração para o preenchimento de vagas existentes, em detrimento da nomeação de candidatos aprovados em certame ainda válido. Precedentes.


(...)


3. Recurso conhecido e provido." (RMS 24.542/MS, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª Turma, DJe de 17/11/2008).


"RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA O CARGO DE PROFESSOR. CONTRATAÇÕES, A TÍTULO PRECÁRIO, DURANTE A VALIDADE DO CERTAME. CONVOLAÇÃO DA EXPECTATIVA DE DIREITO À NOMEAÇÃO E POSSE EM DIREITO LÍQUIDO E CERTO. PRECEDENTES.


1. É cediço que os concursandos não possuem direito subjetivo à nomeação, mas apenas expectativa. Contudo, essa expectativa se convola em direito subjetivo, com a imposição à Administração de nomear o aprovado dentro do prazo de validade do certame, caso tenha havido contratação a título precário para o preenchimento de vaga existente, em detrimento da nomeação de candidato aprovado em certame ainda válido, exatamente como ocorrera na espécie, daí a liquidez e certeza do direito. Precedentes


2. Recurso conhecido e provido para determinar à autoridade coatora que efetive a nomeação e posse do Recorrente no cargo para o qual foi aprovado em concurso público." (RMS 17.302/MS, 5ª Turma, DJ de 30/10/2006).


"ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. FISCAL AGROPECUÁRIO FEDERAL. ACORDOS DE COOPERAÇÃO TÉCNICA ENTRE A UNIÃO E MUNICÍPIOS PARA FISCALIZAÇÃO DE PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL. DEMONSTRAÇÃO DE NECESSIDADE DE PESSOAL. PREENCHIMENTO DE VAGA EXISTENTE. DIREITO LÍQUIDO E CERTO À NOMEAÇÃO.[...]


3. A 'ratio essendi' de a contratação precária de terceiros fazer surgir o direito líquido e certo dos aprovados em concurso público à nomeação às vagas existente, decorre do fato de ela demonstrar a necessidade de pessoal para desempenho de determinada atividade administrativa.


4. Pela mesma razão de ser, a celebração de acordos de cooperação entre a União e Municípios, por meio do qual pessoas que são estranhas aos quadros da Administração Federal passam, sob a supervisão e controle da União, a exercer funções por lei atribuídas aos Fiscais Agropecuários Federal, faz surgir o direito à nomeação daqueles aprovados em concurso público para o aludido cargo, desde que comprovada a existência de vaga.


5. Demonstrado que a impetrante fora aprovada em concurso público para o aludido cargo, para o Estado de Santa Catarina, que seria a próxima a ser nomeada, bem como haver vaga desocupada, exsurge o direito líquido e certo à sua nomeação.


6. Ordem concedida." (MS 13.575/DF, 3ª Seção, Rel.ª Min.ª JANE SILVA – Desembargadora convocada do TJ/MG –, DJ de 01/10/2008).


"ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATOS APROVADOS. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. ILEGALIDADE.


I - É entendimento doutrinário e jurisprudencial de que a aprovação em concurso público gera mera expectativa de direito à nomeação, competindo à Administração, dentro de seu poder discricionário, nomear os candidatos aprovados de acordo com a sua conveniência e oportunidade


II - Entretanto, a mera expectativa se convola em direito líquido e certo a partir do momento em que, dentro do prazo de validade do concurso, há contratação de pessoal, de forma precária, para o preenchimento de vagas existentes, em flagrante preterição àqueles que, aprovados em concurso ainda válido, estariam aptos a ocupar o mesmo cargo ou função.


III - Comprovada pela recorrente a classificação no concurso para professor de língua portuguesa, em primeiro lugar, em ambos os cargos que disputou, bem como incontroverso que houve a contratação, em caráter precário, de profissionais para suprir a carência de pessoal nasce, assim, o direito líquido e certo de exigir da autoridade competente à nomeação, pois demonstrada, inequivocamente, a necessidade de servidores para essa área. Recurso provido, para determinar a nomeação e posse da recorrente." (RMS 24.151/RS, 5ª Turma, Rel. Min. FELIX FISCHER, DJ de 08/10/2007).


A contratação precária para a realização das mesmas tarefas, pela Administração Pública, demonstra a conveniência e a oportunidade de provimento dos cargos vagos, permitindo a nomeação dos servidores aprovados em concurso mesmo após o prazo de validade do certame, tendo em vista que a ilegalidade não pode permanecer e a discussão judicial se refere à nomeação dos candidatos e não os atos da Administração relacionados ao concurso público, consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, que assim determina:


“RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. ENCERRAMENTO DO PRAZO DE VALIDADE DO CONCURSO. FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL. INOCORRÊNCIA.


I - Não caracteriza falta de interesse processual o fato de o mandamus ter sido impetrado após expirado o prazo de validade do concurso, porquanto não se questiona atos da Administração relacionados à realização do concurso público, mas sim atos referentes à nomeação dos candidatos.


II - Todavia, não possui direito líquido e certo à nomeação e posse, quando a nomeação de candidato, com classificação inferior à sua, não decorreu de ato espontâneo da Administração, mas, sim, de cumprimento decisão judicial. Não há qualquer ilegalidade ou arbitrariedade praticada pela autoridade coatora, que agiu em estrita obediência à ordem judicial. Recurso desprovido.


(RMS 24.690/RJ, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 03/04/2008, DJe 12/05/2008)”.


Desta forma, os atos reputados ilegais, ocorridos durante o prazo de validade do concurso, poderão ser impugnados mesmo após expirado esse prazo, notadamente no caso de preterição, o que ocorreu na lide em deslinde. A não ser assim, bastaria a Administração, com a intenção deliberada de desobedecer à ordem de classificação no concurso, deixasse de convocar os candidatos no último dia do prazo de validade. Eventual candidato preterido teria que impugnar essas convocações no mesmo dia, ou seja, até antes de expirar o prazo, o que é inaceitável.


Não só a jurisprudência, como também a doutrina pátria é unânime no sentido de que a nomeação de contratados temporários para exercer funções idênticas de concursando, é considerada uma forma de preterição. Ademais, é interessante transcrever brilhante lição do professor Celso Antônio Bandeira de Melo, a saber:


“A Constituição prevê que a lei (entende-se: federal, estadual, distrital ou municipal, conforme o caso) estabelecerá os casos de contratação para o atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público (art. 37, IX). Trata-se, aí, de ensejar suprimento de pessoal perante as contingências que desgarrem da normalidade das situações e presumam admissões apenas provisórias, demandadas em circunstâncias incomuns, cujo atendimento reclama satisfação imediata e temporária (incompatível, portanto, com o regime de concursos). A RAZÃO DO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL EM APREÇO OBVIAMENTE, É CONTEMPLAR SITUAÇÕES NAS QUAIS OU A PRÓPRIA ATIVIDADE A SER DESEMPENHADA, REQUERIDA POR RAZÕES MUÍTISSIMO IMPORTANTES, É TEMPORÁRIA, EVENTUAL (não se justificando a criação de cargo ou emprego pelo que não haveria cogitar do concurso público), OU A ATIVIDADE NÃO É TEMPORÁRIA, MAS O EXCEPCIONAL INTERESSE PÚBLICO DEMANDA QUE SE FAÇA IMEDIATO SUPRIMENTO TEMPORÁRIO DE UMA NECESSIDADE (nesse sentido ‘necessidade temporária’), POR NÃO HAVER TEMPO HÁBIL PARA REALIZAR CONCURSO, SEM QUE SUAS DELONGAS DEIXEM INSUPRIDO O INTERESSE INCOMUM QUE SE TEM DE ACOBERTAR”. (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 260.). (grifo nosso).


Nesta mesma linha é o posicionamento do Ministro do Superior Tribunal de Justiça Jorge Scartezzini no Recurso Especial 370939/SC. Relator: Ministro Jorge Scartezzini. DJ de 02.08.2004, p. 477:


“É pacífico o entendimento desta Corte de Uniformização no sentido de que, existindo candidatos aprovados em concurso público e a necessidade de prestação de serviços, não deve ser tolerada a contratação precária de terceiros ou dos próprios candidatos para o exercício do mesmo cargo objeto do certame, e ainda dentro do prazo de validade deste. Dessa forma, havendo contratação de pessoal a título precário, a mera expectativa do concursado se convola em direito líquido e certo à nomeação” (grifo nosso).


Desta forma, comprovada a existência de vagas e demonstrada a necessidade de pessoal, em razão da contratação temporária para exercício da função, exsurge o direito subjetivo dos candidatos à nomeação nos cargos para os quais foram aprovados, podendo ser manejada ação judicial visando à nomeação dos candidatos.


Da possibilidade de nomeação de candidatos em sede de liminar em face da preterição e a observância da lei de responsabilidade fiscal

O nosso ordenamento jurídico ventila a possibilidade da concessão de tutela antecipada, bastando, para tanto, apenas a verossimilhança do direito alegado pelos interessados e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, requisitos indispensáveis para o seu deferimento, nessa ordem, traz o CPC no seu art. 273, in verbis


“Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:


I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou


II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu”.


Assim, uma vez demonstrado, na caso concreto, que há documentos aptos a comprovar o direito dos concursados e a ilegalidade que vem sendo cometida, no caso, o desrespeito a ordem classificatória em face da existência das nomeações em caráter precário, cumprido está o requisito previsto no inciso I, do artigo 273 do CPC.


Já o fundado receio de dano irreparável, este se apresenta no fato da necessidade de nomeação do candidato, em face do caráter alimentar que sua remuneração pode lhes representar.


Vale ressaltar, ainda, que a concessão da medida antecipatória não acarretará nenhum prejuízo ao ente público, pois a decisão poderá ser revogada a qualquer tempo durante o trâmite do processo, além de que haveria a contraprestação dos concursandos.


Um ponto importante que deve ser ressaltado é que a vedação existente na Lei de n.º 9.494/97 não abrange a presente situação, pois o impedimento reside na reclassificação ou equiparação de servidores públicos ou a concessão ou aumento de vantagens. Assim, como os concursandos não possuem nenhum vínculo com o ente público, estes não se enquadrando em nenhuma das situações vedadas em lei. Portanto, não ofendem a decisão prolatada pelo próprio Supremo Tribunal Federal na ADC n.º 4.


Sobre o tema, segue a transcrição de recentes julgados dos Tribunais Superiores, vejamos:


“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. RECLAMAÇÃO. AFRONTA AO DECIDIDO NA ADC 4/DF, REL. MIN. SYDNEY SANCHES. AUSÊNCIA DE IDENTIDADE MATERIAL. AGRAVO DESPROVIDO. I - Cinco são as hipóteses para o indeferimento da antecipação de tutela no caso em comento: (a) reclassificação ou equiparação de servidores públicos; (b) concessão de aumento ou extensão de vantagens pecuniárias; (c) outorga ou acréscimo de vencimentos; (d) pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias a servidor público ou (e) esgotamento, total ou parcial, do objeto da ação, desde que refira-se, exclusivamente, a qualquer das matérias acima referidas II - O caso concreto não guarda pertinência com qualquer das hipóteses aventadas, razão pela qual nego provimento ao agravo regimental. III - Agravo desprovido. (Rcl 6093 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 26/06/2008, DJe-152 DIVULG 14-08-2008 PUBLIC 15-08-2008 EMENT VOL-02328-02 PP-00228).


EMENTA: RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL. DEFERIMENTO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA PARA NOMEAÇÃO E POSSE EM CARGO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE DESRESPEITO AO ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA ADC 4. 1. Ao conceder a medida cautelar na Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 4, esta nossa Corte vedou apenas a concessão de tutela antecipada que contrarie o disposto no art. 1º da Lei 9.494/97. 2. A reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou extensão de vantagens (art. 5º da Lei 4.348/64) cuidam da específica situação em que um servidor público postula tais direitos em Juízo. O mesmo vale para o pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias de que trata o § 4º do art. 1º da Lei 5.021/66. 3. A determinação para que candidatos sejam nomeados e empossados em cargo público não ofende a decisão do STF na ADC 4. A postulação para ingresso nos quadros funcionais do Estado diz respeito ao direito de acesso aos cargos, empregos e funções de natureza pública. Direito expressamente assegurado pelo inciso II do art. 37 da Constituição Federal e consistente na instauração de vínculo jurídico até então inexistente. Direito, portanto, à formação de um liame jurídico a que o Poder Público, no caso, resiste. Já os demais direitos subjetivos, versados na ADC 4, esses dizem respeito à continuidade de uma relação jurídica preexistente ou, se se prefere, dizem respeito a institutos jurídicos que têm por pressuposto de incidência uma anterior relação jurídica entre o servidor público e a pessoa do Estado. Relação jurídica em nenhum momento posta em causa quanto à juridicidade de sua formação ou continuidade. 4. Reclamação que se julga improcedente. (Rcl 7212, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 02/06/2010, DJe-120 DIVULG 30-06-2010 PUBLIC 01-07-2010 EMENT VOL02408-03 PP-00882)


EMENTA: SERVIDOR PÚBLICO. Cargo. Concurso público. Candidato aprovado. Nomeação e posse. Antecipação de tutela contra a Fazenda Pública para estes fins. Admissibilidade. Pagamento consequente de vencimentos. Irrelevância. Efeito secundário da decisão. Inaplicabilidade do acórdão da ADC nº 4. Reclamação indeferida liminarmente. Agravo improvido. Precedentes. Não ofende a autoridade do acórdão proferido na ADC nº 4, a decisão que, a título de antecipação de tutela, assegura a candidato aprovado em concurso a nomeação e posse em cargo público. (Rcl 5983 AgR, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/12/2008, DJe025 DIVULG 05-02-2009 PUBLIC 06-02-2009 EMENT VOL-02347-02 PP00224 RTJ VOL-00208-02 PP-00481)”. (grifos nossos).


Outro ponto bastante interessante refere-se à possível afronta à Lei de Responsabilidade Fiscal. Primeiro, porque a citada lei prevê a possibilidade de incremento de despesas por decisão judicial, não havendo nenhuma penalidade em decorrência do cumprimento da decisão. Em segundo lugar, não há aumento de despesas, pois se há contratação de temporários, apenas haveria o redirecionamento da verba.


A Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, visando sempre à prevenção contra desvios capazes de afrontar o equilíbrio das contas públicas.


“Art. 22. A verificação do cumprimento dos limites estabelecidos nos arts. 19 e 20 será realizada ao final de cada quadrimestre.


Parágrafo único. Se a despesa total com pessoal exceder a 95% (noventa e cinco por cento) do limite, são vedados ao Poder ou órgão referido no art. 20 que houver incorrido no excesso:


I - concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título, salvo os derivados de sentença judicial ou de determinação legal ou contratual, ressalvada a revisão prevista no inciso X do art. 37 da Constituição;


II - criação de cargo, emprego ou função;


III - alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa;


IV - provimento de cargo público, admissão ou contratação de pessoal a qualquer título, ressalvada a reposição decorrente de aposentadoria ou falecimento de servidores das áreas de educação, saúde e segurança;


V - contratação de hora extra, salvo no caso do disposto no inciso II do § 6o do art. 57 da Constituição e as situações previstas na lei de diretrizes orçamentárias”.


Destarte, não haveria nenhum impacto financeiro no orçamento do ente público, já que haveria apenas a substituição dos temporários pelos concursandos. Além disso, mesmo que a nomeação dos concursandos representasse a extrapolação do limite legal de 95% (noventa e cinco) por cento do total das despesas, não haveria a imposição de nenhuma sanção ao ente, vez que há uma ressalva legal referente à reposição decorrente de aposentadoria e falecimento.


Vale salientar que, mesmo que se entendesse que poderia o ente público sofrer sanções decorrentes da infração do limite legal estabelecido na Lei de Responsabilidade Fiscal, essa mesma legislação, em seu artigo 19, dispõe que não serão computados como despesa os valores pagos decorrentes de decisão judicial, a saber:


“Art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados:


(...)


§ 1o Na verificação do atendimento dos limites definidos neste artigo, não serão computadas as despesas: (...)


IV - decorrentes de decisão judicial e da competência de período anterior ao da apuração a que se refere o § 2o do art. 18;”


Quanto à matéria, já é pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que as despesas decorrentes das nomeações de pessoal, em face de determinação judicial, não entram no cômputo dos limites fixados pela lei acima mencionada:


“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO APOSENTADO. GRATIFICAÇÃO DE ATIVIDADE TÉCNICA. EQUIPARAÇÃO COM SERVIDORES EM ATIVIDADE. CABIMENTO. OFENSA À LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL. NÃOOCORRÊNCIA. LEI "CAMATA". INAPLICABILIDADE. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.


1. O Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão no sentido de que não incidem as restrições sobre as despesas com pessoal, previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal, quando decorrerem de decisões judiciais, nos termos do art. 19, § 1º, IV, da LC 101/00.


2. Segundo o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal, a Lei "Camata", que regulamentou o art. 169 da Constituição Federal de 1988, ao fixar os limites de despesas com pessoal dos entes públicos, não pode servir de fundamento para elidir o direito dos servidores públicos à fruição de vantagem já assegurada por lei.


3. Recurso especial conhecido e improvido.


(REsp 935.418/AM, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 19/02/2009, DJe 16/03/2009). RECURSO ESPECIAL. AGRAVO REGIMENTAL.


ADMINISTRATIVO. SERVIDOR ESTADUAL. INCORPORAÇÃO DE GRATIFICAÇÃO. OFENSA AO ART. 21, I, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 101/2000. NÃO-OCORRÊNCIA. APLICAÇÃO DO ART. 19, § 1º, IV, DESSE MESMO DIPLOMA LEGAL. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. AUSÊNCIA DO NECESSÁRIO CONFRONTO ANALÍTICO.


1. Esta Casa possui orientação firme, referida na decisão atacada (AgRg na SS 1231/SC, Rel. Min. Edson Vidigal, Corte Especial), no sentido de que não incidem as restrições de despesa com pessoal previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal quando estiver em jogo o cumprimento de decisões judiciais, a teor do seu art. 19, § 1º, IV. 2.


A falta de cumprimento do disposto nos artigos 541, parágrafo único, do Código de Processo Civil e 255, § 2º, do RISTJ, que determinam a realização do cotejo analítico entre o acórdão recorrido e os paradigma trazido à colação, obsta o conhecimento do recurso pela alínea "c" do permissivo constitucional. 3. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 757.060/PB, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, DJe 30/6/08)”. (grifo nosso).


Como se vê, a escusa de tais entes públicos em cumprir a Constituição Federal é patente e inaceitável, pois estão burlando a legislação com o intuito de privilegiar um ou outro cidadão.


Publicado em 10/2014 pelo jus.com.br através do link: https://jus.com.br/artigos/33066/pretericao-em-face-da-contratacao-detemporario

 

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